segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Desperto ou Dormindo?

Acho que todos, alguma ou algumas vezes na vida, já se perguntaram se estão despertos ou se ainda dormem, espiritualmente falando. Afirmo isso com conhecimento de causa, pois eu mesmo, até pouco tempo achava que estava ainda “despertando”, mas que, de fato, não era ainda um “desperto”.
Hoje vou contar a você um pouco de minha experiência nesse campo e como consegui entender profundamente a diferença entre estar dormindo ou desperto. Quem sabe lendo sobre minha experiência, você consiga abrir um pouco mais a mente e perceba o que acontece dentro de você mesmo.


A eterna busca pela iluminação

Um dos grandes entraves ao meu processo de despertar foi o de projetar esta condição a um evento futuro. Eu já sabia a diferença entre estar desperto e dormindo, já tinha experimentando um sono profundo por um período em que me deixei levar pelos grilhões da religião. Entendi, portanto, que o meu processo de despertar iniciou-se quando percebi a prisão mental da religiosidade. Entretanto, acreditei que o caminho teria que terminar com um “gran-finalle”, algo que não me deixasse mais dúvidas de que estava no caminho certo, aguardava o momento da tão sonhada iluminação. Assim, perdi um tempo precioso buscando a iluminação que me corroborasse a condição de desperto e a partir dos quais “todos os meus problemas acabariam”... a iluminação era um verdadeiro produto tabajara.
Assim, devorei livros sobre vários assuntos “exotéricos”. Meditação, espiritualidade, ufologia, projeção da consciência, vidas passadas... todos eram assuntos fáceis na minha biblioteca. Porém, minha frustração só crescia com o passar do tempo. Pois quanto mais aprendia, menos progressos eu via e a iluminação nunca chegava.

Não haverá um evento extraordinário

Nessa minha busca, eu já tinha entendido que a verdade estava dentro de mim e não fora. Assim, parei de ler livros sobre teorias e experiências dos outros e passei a ler livros que me ensinariam técnicas de como eu ter as minhas próprias experiências e descobrir por mim mesmo as tais verdades fundamentais. Assim, voltei a cair no erro e “travei” no progresso tentando sair do corpo, lembrar minhas vidas passadas, entrar em contato com o meu Eu superior... Muito tempo perdi nessa empreitada. Até que num belo dia a ficha caiu: “Não é projetando um evento futuro que atingirei a iluminação”. Lógico, o futuro não existe!!!! E eu me peguei sabotando a mim mesmo, achando que o despertar deveria culminar com uma bela viagem astral ou uma expansão da consciência que me daria uma experiência um tanto quanto psicodélica... Eventos para o qual eu deveria me preparar e que aconteceriam quando eu estivesse pronto. Ou seja, eu estava aguardando por um futuro que nunca chegaria, pois o que existe é só o Agora e o despertar só pode ser alcançado agora, com os recursos que você possui neste momento e não num evento extraordinário que venha a acontecer no futuro e pelo qual você pode passar a vida toda a esperar.

É necessário se libertar do EGO

Depois desta "sacada", que tive durante um momento de meditação, todos os entraves foram por água abaixo. A partir deste momento percebi que até agora estava tentando despertar através do EGO e este, me armava armadilhas as mais diversas para me manter preso ao seu domínio, pois o despertar traz como consequência a libertação do ego. Percebi que minha ânsia por despertar já estava latente em mim desde o princípio. Não como vontade egóica, mas como planejamento anterior ao ego, anterior ao surgimento desta personagem que interpreto agora. Entretanto, o Ego se tornara muito forte neste personagem e armava estratagemas para me ludibriar. Primeiro me encaminhou para as religiões. Já fui católico, espírita, evangélico... depois, me encaminhou para os livros, para as técnicas, para a eterna busca. Quando me libertei de seu domínio, entendi que o despertar não é algo que se compreende com a mente, não é algo que se alcance utilizando técnicas e métodos. Técnicas, métodos, teorias, explicações, são coisas pertencentes ao domínio do Ego, ele fica muito confortável entre estas coisas. Enquanto você não driblar o ego, permanecerá nessa roda-viva em busca de algo que o ego não está disposto a lhe dar.

Despertar é a arte de lembrar

Agora entendo que despertar é lembrar quem você é. Essa é realmente a sensação que temos  quando nos damos conta que estamos despertos. Outra coisa que percebi foi que o que lembrei agora é algo que eu já sabia quando era criança e só agora me dei conta disso. Essa persepção me trouxe outra revelação: "Nós não nascemos dormindo, nós adormecemos no decorrer da vida". Por conta do sistema que nos foi imposto, por conta da densidade desta dimensão... os fatores são muitos. Assim, a partir de agora terei bastante cuidado com a educação de meu filho. Farei o possível para que ele mantenha viva a conexão com a Fonte e não adormeça como aconteceu comigo e como acontece com 99.99% da humanidade. É completamente verdadeiro aquele ensinamento do mestre  que diz: "Em verdade vos digo que, qualquer que não receber o reino de Deus como menino, não entrará nele". 

Você precisa se render

Para que você drible o ego e lembre-se quem verdadeiramente você é, é necessário que você se renda, pare de brigar com o ego e só escute. Deixe o ego esbravejar e lutar sozinho e apenas observe. Se você lutar com ele ele só ficará mais forte e a luta será inglória para você. Porque a vitória, o combate, a competição, são objetivos desejados pelo Ego. O Eu maior não está interessado em vencer ou preocupado em perder, a Ele o importante é experimentar e atingir a meta planejada. A rendição, no caso, não funciona somente com o ego, mas com todas as circunstâncias da vida. O ato de render-se dá fim a qualquer conflito, interno ou externo e põe o universo a "girar". Quando despertei, ví que isso já aconteceu diversas vezes na minha vida, quando por pouquíssimos segundos ouvia meu Eu interno e atendia a sua sugestão para que me rendesse e deixasse as coisas fluirem. O exemplo mais vivo que tenho disso foi na época que conheci minha esposa. Antes de conhecê-la, vivia sentindo pena de mim por "ser uma pessoa solitária", alimentava esse sentimento e me auto-sabotava para que desse razão a minha sina. Um belo dia, pensei comigo mesmo: "Quer saber, não vou mais me preocupar com isso". Pouco tempo depois conheci aquela com quem me casaria e seria muito feliz, simples assim. 
Na verdade, foi no processo de rendição que me dei conta que um mega evento pirotécnico não me era necessário para o despertar. Não que isso seja uma regra geral. Muitas pessoas experimentam uma experiência transcendental que mudam sua forma de ver o mundo para sempre, entretanto, quando me rendi ao fato de que talvez isso não aconteça comigo, fiz as pazes com o ego e pude ouvir a voz interior me dizendo que não era o momento para isso acontecer comigo. Meu Eu é quem determinou, antes desse personagem "descer" ao fisico, que a experiência "transcendental" não aconteceria até o tempo certo chegar. Ainda não me foi revelado quando, talvez seja só no momento de "voltar pra casa", mas se o meu Eu maior,  que tem a visão mais ampla de tudo,determinou assim, quem é meu ego para discutir? Percebeu como a coisa funciona?

O Ego não é seu inimigo

Como falei a pouco, a rendição acaba com a disputa, com o conflito. Isso me fez perceber que apesar de meu ego ter travado essa luta comigo durante tantos anos, ele não é meu inimigo. Na verdade, quando você desperta, fica mais claro o papel dele em sua vida. O ego é bastante útil na vida cotidiana. É ele que o permite interagir com o mundo e com as outras pessoas e não expor sua essência desnecessariamente. Existem ocasiões na vida onde o Eu é bem menos útil que o Ego. Eu escolhe ceder o domínio ao ego no trânsito, por exemplo. Já imaginou um Eu superior, generoso, manso, despreocupado, dirigindo num trânsito que mais parece uma selva?! Neste e em outros casos específicos, permito que o Ego tome de conta e faça o seu trabalho. Em ocasiões onde meu Eu não gostaria de estar ou não tem um pingo de interesse em participar, quem assume? Ele, o bom e velho ego aparece para cuidar da situação. Dessa forma, meu Eu se preserva de estar presentes em momentos sem significado ou maior importância para minha experiência nesse mundo. Assim, a maioria das pessoas com quem convivo só conhecem meu Ego, não a mim verdadeiramente. Minha essência escolho revelar àqueles que estejam prontos para entrar em comunhão com ela, compreendê-la e trocar experiências construtivas. Como vocês, a quem me mostro verdadeiramente, sem as pretensões ou exibicionismos do Ego e conversando sobre assuntos que meu Eu se interessa e não pelas trivialidades para as quais delego ao meu Ego tomar de conta.

Então é isso. Espero que minha experiência o ajude na sua caminhada.

Um abraço, rumo ao despertar.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Desapego ou Desamor?

Hoje gostaria de deixar de lado um pouco as "grandes questões" e conversar com você sobre algo um pouco mais singelo, entretanto, não menos importante: O Desapego. Todo aquele que busca a iluminação sabe que o desapego é um elemento chave para a evolução humana. Então, por que é tão difícil colocá-lo em prática?

Apego X Amor

Um dos motívos pelo qual é tão difícil praticar o desapego, é por causa da resistência humana a esta conduta. A prática do desapego é desencorajada em todos os seguimentos da sociedade! Nós somos ensinados desde cedo a nos apegar a tudo e a todos. Devemos nos apegar a nossos pais, nossos pertences, nossa vida... Confundimos apego com amor e passamos a vida toda cultivando o apego sem cultivar o amor.
Só sabemos o que é o amor incondicional quando livres das amarras das paixões e do apego. O amor é totalmente o oposto do apego (que é o conceito distorcido de amor) pois o amor liberta, o apego, aprisiona. O apego é o sentimento predileto do EGO. Na verdade, o apego é o grande alimentador do ego. Veja, o amor distorcido de hoje, na verdade, é o amor ao próprio ego, pura e simplesmente.
As pessoas querem possuir coisas para alimentar o ego. Casa, carro, status... tudo isso é desejo do ego, fortalecido pelo apego, é o sentimento de posse. Esse mesmo sentimento é o que dirige as relações humanas hoje. É MEU FILHO, MEU MARIDO, MINHA ESPOSA... percebes? O apego às pessoas é taxado como amor. Mas como já foi dito aqui, o apego só alimenta o Ego, então, as pessoas não amam os cônjuges, pais ou filhos, elas os querem para satisfazer o ego. Quer um exemplo? Porque é tão comum as pessoas casarem-se e se separarem algum tempo depois? Será que o amor acabou?!? É claro que não! O que acontece, na maioria das vezes, é que se apegam ao prazer causado pelo coquetel químico desencadeado pela paixão. Quando a paixão acaba, acaba o motivo pelo qual se casam. Então o ego corre atrás de outra pessoa que descarrege a quimica novamente... quando não é a paixão que move o relacionamento, é o interesse. O coroa ricásso casa com a menininha novinha para desfilar com o troféu perante seus pares... já a menininha encara o coroa pelo conforto material e pela segurança. É tudo uma troca de interesses. É difícil para a pessoa conceber o amor sem a troca. "Eu o amo, mas você me deve fidelidade", não é assim? "Eu o amo, mas você tem que mudar esse seu jeito", "Eu amo você, mas você precisa me dar um pouco mais de atenção"... todas essas frases resumem o apego, não o amor. As pessoas amam a si próprias e querem possuir o outro, para que este satisfaça suas necessidades, sua carência de carinho, atenção, recursos financeiros, sexo...
Já o amor verdadeiro não impõe condições de forma alguma. O mais próximo que o ser humano comum hoje chega do amor verdadeiro é no relacionamento mãe/filho. Quando você ama de verdade, o importante é fazer o outro feliz e não o contrário. E mais importante ainda, amor não é sentimento, é escolha, é atitude. Sentimento faz parte do ego, anda de mãos dadas com o apego.

O desapego é a chave para o despertar espiritual

Com o desapego vem a libertação de Maya, a ilusão da fisicalidade. A partir do desapego, nos tornamos capazes de nos libertar do Medo! Medo da perda, medo da rejeição, medo do fracasso, medo da morte. Assim, podemos descobrir como passear por esta dimensão totalmente libertos para aprender, para amar verdadeiramente e cumprir o que nos cabe neste mundo. A visão espiritual é imcompatível com o apego. O apego contamina a mente do homem tão intensamente que o torna cego para tudo o que não esteja ao alcançe de seus sentidos. O apego mergulha o homem profundamente na matéria e contribui para a perda da identidade espiritual, da conexão com a fonte de tudo o que é, a conexão consigo mesmo.

Equilibrio Emocional X Frieza

Quando alguém foge ao padrão da maioria da humanidade e desenvolve o equilibrio emocional resultante da prática do desapego, é taxado de frio, insencível, coração de pedra... Confesso que já fui chamado de todos esses adjetivos, principalmente nos primeiros anos de minha vida. Isso por que, desde criança, tive a dádiva de desenvolver o desapego. Não aprendi isso com ninguém, pelo menos não nesta vida. Foi algo que aconteceu naturalmente, de forma inata. Entretanto, me custou e me custa muito caro até hoje. As pessoas estão acostumadas ao apego e rejeitam qualquer atitude diversa, você é cobrado a ter uma atitude mais emocional, passional. Caso contrário, você é taxado como alguém que não ama, que não tem vínculos afetivos. Isso soa familiar para você? Se sim, bem vindo ao clube! Mas lembre-se que o errado não é você, você está no caminho certo.

Um abraço.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Você Não É a Sua Mente


O MAIOR OBSTÁCULO À ILUMINAÇÃO

Iluminação — o que é isso?

Festival+de+Wesak+-+Senhor+Buda.gif&t=1Há mais de trinta anos que um pedinte se sentava na berma de uma estrada. Um dia, passou por ali um estranho. "Dá-me uma moedinha?" pedinchou o pobre, estendendo automaticamente o seu velho boné de basebol. "Não tenho nada para te dar", disse-lhe o estranho. Depois perguntou: "o que é isso em que estás sentado?" "nada", respondeu o pedinte. "Apenas uma caixa velha. Sento-me nela desde que me lembro." "Algum dia viste o que tem dentro?" Tornou o estranho. "Não", respondeu o pobre. "De que me serviria? Não há nada lá dentro."
"Vê o que tem dentro", insistiu o estranho. O pedinte conseguiu forçar a tampa. Com surpresa, incredulidade e exaltação, verificou que a caixa estava cheia de ouro.
Eu sou aquele estranho que não tem nada para lhe dar, mas que lhe diz para olhar para dentro. Não para dentro de uma caixa qualquer, como na parábola, mas para dentro de uma coisa ainda mais próxima: para dentro de si próprio.
"Mas eu não sou um pedinte", dirá você.
Todos aqueles que não encontraram a sua verdadeira riqueza, que é a radiosa alegria do Ser e a paz profunda e inabalável que a acompanha, são pedintes, por maior que seja a fortuna material que possuam. Esses, para terem valor, segurança ou amor, procuram fora de si vislumbres de prazer ou de realização pessoal, enquanto que dentro de si próprios possuem um tesouro que não só inclui  todas aquelas coisas, mas é também infinitamente maior do que tudo o que o mundo tem para lhes oferecer.
A palavra iluminação invoca a ideia de uma realização sobre-humana, e o ego gosta de a encarar assim, mas ela não é mais do que o seu estado natural de união sentida com o Ser. É um estado de ligação com alguma coisa incomensurável e indestrutível, com uma coisa que, quase paradoxalmente, constitui a sua essência e, no entanto, é muito maior do que você.  Trata-se de encontrar a sua verdadeira natureza, para além de um nome e de uma forma. A incapacidade de sentir essa ligação dá origem à ilusão da separação, tanto de si próprio como do mundo à sua volta. Você tem então a percepção de si próprio, consciente ou inconscientemente, como um fragmento isolado. Surge o medo, e o conflito interior e exterior torna-se uma norma.
Gosto da definição simples que Buda deu da iluminação: "o fim do sofrimento". Não há nada de sobre-humano nisto, não é verdade? É certo que, como definição, é muito incompleta. Apenas lhe diz o que a iluminação não é: não é sofrimento. Mas o que resta quando deixa de haver sofrimento? Buda mantém silêncio quanto a isso, e o seu silêncio significa que cada um tem de o descobrir sozinho. Ele utiliza uma definição negativa para que a mente a não possa transformar numa crença ou numa realização sobre-humana, numa meta que não possa alcançar. Apesar desta precaução, a maioria dos budistas ainda acredita que a iluminação é para Buda, não para eles, pelo menos na vida presente. 

Empregou a palavra Ser. Pode explicar o que entende por isso?

ser%20feliz.jpg O Ser é a Vida Única, eterna e sempre presente para além da diversidade de formas de vida sujeitas ao nascimento e à morte. No entanto, o Ser é ao mesmo tempo transcendente e imanente a cada forma, sendo a sua essência mais profunda, invisível e indestrutível. Significa isto que você lhe tem acesso agora sob a forma do seu Eu mais profundo, da sua verdadeira natureza. Mas não procure agarrá-lo com a sua mente. Não tente compreendê-lo. Só o poderá conhecer quando a sua mente estiver aquietada. Quando estiver presente quando a sua atenção estiver plena e intensamente no Agora, o Ser poderá ser sentido, mas nunca poderá ser compreendido mentalmente. A iluminação é recuperar o conhecimento do Ser e manter-se nesse estado de "sentir-percepção".

Quando diz Ser, refere-se a Deus? Se sim, porque não o diz?

A palavra Deus foi esvaziada do seu sentido ao longo de milhares de anos de utilização abusiva.  Por vezes, eu emprego a palavra, mas faço-o com moderação. Por utilização abusiva, quero significar que há pessoas que sem nunca terem vislumbrado sequer o reino do sagrado, a vastidão infinita por trás dessa palavra, a usam com grande convicção, como se soubessem do que estão a falar. Ou então, argumentam contra ela, como se soubessem o que estão a negar. Tal utilização abusiva dá origem a crenças absurdas, asserções e ilusões egoicas, do género "O meu ou o nosso Deus é o único Deus verdadeiro, e o teu Deus é falso", ou como a famosa afirmação de Nietzsche "Deus está morto".
A palavra Deus tornou-se um conceito fechado. No momento em que a palavra é pronunciada, cria-se uma imagem mental, talvez já não a de um velho de barbas brancas, mas ainda assim uma representação mental de alguém ou de alguma coisa exterior a si e, sim, é verdade, quase inevitavelmente alguém ou alguma coisa do sexo masculino.
Nem Deus, nem Ser, nem qualquer outro termo conseguem definir ou explicar a inefável realidade por trás destas palavras, pelo que a única questão importante é saber se a palavra em questão o ajuda ou o impede de ter a experiência daquilo para que ela aponta. Será que ela aponta para além de si própria para essa realidade transcendental, ou presta-se com demasiada facilidade a não ser mais do que uma ideia na sua cabeça, uma crença, um ídolo mental?
A palavra Ser não explica nada, mas a palavra Deus também não. Ser, no entanto, tem a vantagem de ser um conceito aberto. Não reduz o invisível infinito a uma entidade finita. É impossível formar uma imagem mental da palavra. Ninguém pode reclamar a propriedade exclusiva do Ser. Trata-se da sua própria essência, e você tem-lhe acesso imediato ao sentir a sua própria presença, o entendimento de que o Eu sou é anterior a pensar "eu sou isto" ou "eu sou aquilo". Por conseguinte, da palavra Ser à experiência de Ser não vai mais do que um pequeno passo.

 Qual é o maior obstáculo que se opõe a que tenhamos a experiência dessa realidade?

dificuldades.gif&t=1 A identificação com a sua mente, o que faz com que o pensamento se torne compulsivo. Não ser capaz de parar de pensar é uma aflição terrível, mas nós não o compreendemos porque praticamente toda a gente sofre do mesmo mal, pelo que se considera normal. Esse barulho mental incessante impede que você encontre o reino da quietude interior que é inseparável do Ser. Cria igualmente um falso eu, obra da mente, que lança uma sombra de medo e sofrimento. Mais adiante, veremos tudo isso em pormenor.
O filósofo Descartes acreditava que tinha encontrado a verdade mais fundamental ao fazer a sua famosa afirmação: "Penso, logo existo".Na verdade, estava a dar expressão ao erro mais básico: equiparar pensar a Ser e identidade a pensamento. O pensador compulsivo, o que significa praticamente toda a gente, vive num estado de aparente separação, num mundo insensatamente complexo de problemas e conflitos contínuos, um mundo que reflete a sempre crescente fragmentação da mente. A iluminação é um estado integral, de se estar "em uníssono" e, por conseguinte, em paz. Em uníssono com a vida no seu aspecto manifestado, o mundo, assim como com o seu Eu mais profundo e a vida não manifestada – em uníssono com o Ser. A iluminação não é apenas o fim do sofrimento e do permanente conflito interior e exterior, é também o fim da temível escravidão ao pensar incessante. Que incrível é esta libertação!
A identificação com a mente cria um filtro opaco de conceitos, rótulos, imagens, palavras, críticas e definições que bloqueiam qualquer relacionamento verdadeiro. Coloca-se entre você e o seu Eu, entre você e o seu semelhante, entre você e a Natureza, entre você e Deus. É este filtro de pensamento que cria a ilusão da separação, a ilusão de que existe você e um "outro" totalmente separado. Então você esquece-se do facto essencial de que, por baixo do nível das aparências físicas e das formas separadas, você é uno com tudo o que é.
Quando digo que você se esquece, quero dizer que deixa de sentir essa unicidade como uma realidade evidente por si mesma. Poderá acreditar que talvez ela seja verdadeira, mas deixa de saber que ela é verdadeira. Uma crença poderá ser reconfortante. Contudo, é unicamente através da sua própria experiência que ela se torna libertadora.
Pensar tornou-se uma doença. A doença ocorre quando as coisas perdem o equilíbrio. Por exemplo, não há nada de errado na divisão e multiplicação das células do corpo, mas quando esse processo se perpetua à margem da totalidade do organismo, as células proliferam e surge uma doença.
Nota: A mente é um instrumento magnífico se for usada corretamente. Contudo, se for usada erradamente torna-se muito destrutiva. Falando com mais exatidão, não se trata tanto de você usar a mente erradamente – geralmente não a usa de maneira nenhuma. É ela que usa a você. É a doença. Você acredita que é a sua mente. É a ilusão. O instrumento tomou conta de você.

Não estou totalmente de acordo com você. É certo que a minha mente deambula, por vezes, como acontece com a maioria das pessoas, mas ainda assim posso decidir usar a minha mente para obter e realizar coisas, e faço-o constantemente. 

pensar.jpg&t=1Só porque você consegue resolver um problema de palavras cruzadas ou construir uma bomba atómica não quer dizer que esteja a usar a sua mente. Da mesma maneira que os cães gostam de roer ossos, também a mente gosta de se dedicar aos problemas. É por essa razão que ela resolve problemas de palavras cruzadas e constrói bombas atómicas. Você não se interessa por nenhuma dessas coisas. Deixe-me fazer-lhe uma pergunta: pode libertar-se da sua mente sempre que o deseje? Já descobriu o botão que a "desliga"?  
Quer dizer, parar de pensar totalmente? Não, não posso, salvo talvez por alguns breves instantes.
 Então a mente está a usá-lo. Inconscientemente identificado com ela, você nem sequer sabe que é escravo dela. É quase como se estivesse possuído sem o saber, e por isso julga que a entidade possessora é você próprio. O começo da libertação é a compreensão de que você não é a entidade possessora – o pensador. Saber isso permitir-lhe-á observar a entidade. No momento em que começar a observar o pensador, é ativado um nível mais elevado de consciência. Depois começará a compreender que existe um vasto reino de inteligência para além do pensamento, que o pensamento é meramente um pequeno aspecto dessa inteligência. Também compreenderá que todas as coisas que realmente contam – beleza, amor, criatividade, alegria, paz interior – têm origem para além da mente.

Você começará a despertar.

Trecho do livro O Poder do Agora de Echkhart Tolle